27/05/2021

Justiça Militar da União condena sargento da Marinha por abuso sexual em missão de paz da ONU no Líbano

Um sargento da Marinha do Brasil, integrante da missão de Paz das Nações Unidas (ONU) no Líbano, foi condenado na Justiça Militar da União, em Brasília, a quatro anos, cinco meses e 22 dias de reclusão. Ele foi acusado de abuso sexual, cometido contra duas mulheres libanesas e de divulgação de imagens via aplicativo de mensagens.

O militar também recebeu do Conselho de Justiça Permanente (CPJ), da 1ª Auditoria Militar de Brasília, a pena acessória de exclusão das Forças Armadas. Da decisão ainda cabe recurso ao Superior Tribunal Militar (STM).

Ele foi acusado pelos crimes constranger alguém, sob ameaça, a manter ato libidinoso diverso da conjunção carnal, crime previsto artigo 233 de Código Penal Militar e por divulgação de cena íntima sem autorização, crime previsto no artigo 218-C do Código Penal Brasileiro.

O graduado, que fazia parte do contingente brasileiro da ONU, compondo os chamados blue helmets, onde cada um e todos os membros representam, em primeiro plano, a Organização das Nações Unidas, e, depois, o seu país, teve a pena aumentada em um quinto, justamente por representar a ONU e o Brasil.

O caso ocorreu entre abril e junho de 2019. Segundo o Ministério Público Militar (MPM), o sargento, durante o desempenho de suas funções na missão da Força Interina das Nações Unidas no Líbano (FTM-UNIFIL) conheceu duas mulheres pelo aplicativo de relacionamento Tinder, engatou um relacionamento íntimo com ambas, com a promessa de casamento e moradia no Brasil.

Mas, em determinado momento, constrangeu uma delas, mediante violência e sem consentimento, a praticar consigo ato libidinoso, abusando da confiança nele depositada pela vítima. O militar também teria transmitido a terceiro, via aplicativo de mensagens, sem o consentimento da ofendida, cena de sexo, envolvendo a vítima, identificando-a expressamente como sua namorada.

Em juízo, o militar negou a prática de agressão ou violência e não esclareceu o tipo de relacionamento que mantinha com a Ofendida.

A juíza federal da Justiça Militar da União Flávia Ximenes Aguiar, que presidiu o Conselho de Justiça, composto por mais quatros oficiais da Marinha, arguiu, em seu voto, que a Defesa do militar, num compreensível esforço de inverter o ônus da prova em favor da versão do acusado, sustentou que não haveria prova de que a imagem analisada no processo fosse de uma das vítimas, a fim de justificar a invocação do princípio do in dubio pro reo.

Entretanto, disse a Juíza que, ainda que a imagem não estivesse suficientemente associada à mulher, a contraprova aventada pela Defesa somente seria possível por intermédio de violação íntima ainda maior em relação a ofendida, a exigir (o inexigível) que a ofendida, ou mesmo outra pessoa que recebeu as imagens, apresentasse suas partes íntimas para serem comparadas com a foto divulgada, a fim de contradizer a associação de imagens feita.

“Impensável tal possibilidade. Ora, se ele manda uma foto de rosto, abraçado com a vítima, dizendo que esta é a "minha namorada libanesa" e, depois, manda uma foto, mantendo conjunção carnal, e afirma ser esta a sua namorada, então, restou configurada a violação da intimidade da libanesa, uma vez que a imagem do ato sexual foi a ela atribuída, sem chance, no repasse da imagem, de qualquer contestação”.

Para a magistrada, todo o arcabouço probatório apontou no sentido de que o acusado, com consciência e vontade, transmitiu o registro fotográfico de cena de sexo, identificando como sendo ele próprio com a libanesa, sem que houvesse consentimento para tal associação de imagens e divulgação.

“Restou evidente que o sargento era "habitué" e vezeiro em aplicativos de relacionamento e expôs o bom nome da Força de Paz e do Brasil ao se envolver, de forma leviana e irresponsável, com as locais, sem um mínimo de preocupação com o desenrolar de suas aventuras, a ponto de a ONU ter acionado as cláusulas do Memorandum of Understanding, para que o Brasil tomasse as providências sobre a noticia criminis registrada naquele Organismo Internacional”.

Os demais juízes do CPJ seguiram o voto da magistrada e condenaram o réu, ao qual foi assegurado o direito de recorrer em liberdade.

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