Um tenente de carreira da Aeronáutica foi declarado indigno para o oficialato após decisão do Superior Tribunal Militar (STM) por intermédio do Conselho de Justificação. O oficial foi acusado de ser usuário contumaz de diversos tipos drogas, inclusive drogas sintéticas, além de proceder contra o decoro da classe em diversas ocasiões, principalmente em redes sociais.
O Conselho de Justificação é um procedimento ético, iniciado nas Forças Armadas e finalizado no Tribunal Militar. Difere-se dos julgamentos criminais, que geralmente são iniciados pela primeira instância da Justiça Militar da União (JMU). O Conselho de Justificação é um processo especial, autônomo, que visa apreciar determinadas condutas praticadas por militar sob o aspecto ético-moral, sejam elas objeto, ou não, de sanção disciplinar ou criminal, de forma a avaliar a capacidade do oficial das Forças Armadas de permanecer na ativa. O instituto está previsto no art. 1º da Lei 5.836, de 5 de dezembro de 1972.
Entre as provas compartilhadas pela Polícia Federal com autorização judicial estão a postagem de inúmeras mensagens em redes sociais com informações sobre o consumo de drogas, efeitos experimentados com o uso, conhecimento sobre drogas sintéticas e até incentivo ao uso dessas substâncias ilícitas.
Para a acusação, a conduta do militar se revelou de grave desvio moral, não condizente com o comportamento esperado de um oficial da Força Aérea Brasileira (FAB).
“A carreira das armas exige que o oficial mantenha um elevado padrão de conduta moral, de forma que um bom desempenho profissional não justifica condutas altamente danosas aos princípios da ética militar”, postulou o representante do MPM.
Ainda segundo a acusação, o Estatuto dos Militares prescreve que o sentimento do dever, o pundonor militar e o decoro da classe impõem, a cada um dos integrantes das Forças Armadas, conduta moral e profissional irrepreensíveis, pautando em seus incisos os princípios éticos que devem ser observados por todo militar.
“Tais valores devem ser guardados pelo oficial das Forças Armadas, tanto em serviço como fora dele, na vida pública e na particular, de maneira que a falta de integridade e de zelo pelos valores morais que pautam a vida castrense repercutem na esfera jurídica do militar, pois os princípios consubstanciados no art. 28 da Lei nº 6.880/1980 exigem conduta moral irrepreensível e obediência aos preceitos da ética militar, em todas as circunstâncias.”
Para o MPM, o oficial foi responsável pelas postagens que fez, independentemente dos fins que almejava. “Todo militar, e sobretudo um oficial com formação na Academia da Força Aérea, tem consciência de que postar mensagens com conteúdo diretamente relacionado ao uso de substâncias entorpecentes, em um grupo em que participavam militares e civis, caracteriza evidente infração funcional e afronta aos preceitos básicos da ética militar. Tais mensagens têm o potencial de denegrir o prestígio e honorabilidade da Instituição e do próprio militar, sendo que a conduta, em si, já demonstra elevado grau de desprezo pelos valores morais que norteiam a vida castrense.”
Ao apreciar o caso, o relator, ministro Lúcio Mário de Barros Góes, votou pela procedência da acusação e considerou o militar não justificado, assim, culpado das imputações que lhe foram feitas, declarando-o indigno do oficialato e, em consequência, determinando a perda de seu posto e de sua respectiva patente.
Para o ministro, no caso, diferentemente do que o alegado pela defesa do tenente da FAB, não houve violação aos princípios da razoabilidade, impessoalidade e proporcionalidade porque as condutas perpetradas por ele se revestiram de alta lesividade e feriram gravemente os princípios da ética que orientam a vida castrense.
“As menções aberta e diretamente relacionadas ao uso de drogas, a familiaridade com o universo das drogas sintéticas, a tolerância e até incentivo ao uso de substâncias entorpecentes são condutas totalmente incompatíveis com o comportamento esperado de um Oficial da Força Aérea Brasileira”, votou o ministro.
Ainda de acordo com o relator, por meio de suas condutas, contrárias à honra pessoal, ao pundonor militar e ao decoro da classe, o tenente violou os preceitos ético-morais do Estatuto dos Militares, o que tormou impossível de acatar a tese de considerá-lo justificado e, consequentemente, permanecer na ativa.
“O oficial das Forças Armadas passa por uma longa e rígida formação nas Academias Militares, de forma que possui maturidade e preparo suficientes para saber que o tipo de conduta apurada nesses autos é inimaginável e intolerável, pois dele se espera exatamente o contrário. Ao analisar condutas graves submetidas ao julgamento ético, esta Corte Castrense tem relembrado que os militares lidam com valores sublimes, como a vida e a própria soberania estatal, de maneira que se exige do militar, especialmente do oficial, que representa modelo paradigmático a ser seguido, retidão comportamental inequívoca, inclusive na vida particular", fundamentou o ministro Lúcio.
O voto dele foi confirmado pelos demais ministros do Superior Tribunal Militar. O caso correu em segredo de justiça.
CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO Nº 7000743-97.2020.7.00.0000