Brasília, 6 de outubro de 2011 – Em julgamento marcado, os ministros do Superior Tribunal Militar (STM) decidiram, por unanimidade, manter a condenação de dois capitães do Exército pelo crime de coação, descrito no artigo 342 do Código Penal Militar (CPM). A pena imposta foi de um ano de reclusão, com o benefício da suspensão condicional da pena por dois anos.

Segundo os autos, o capitão M.M.B. pediu ao 3º sargento C.L.F., seu subordinado, que lhe entregasse o envelope lacrado com as provas de Língua Inglesa que seriam aplicadas aos candidatos interessados em participar da missão de paz no Haiti. As avaliações estavam sob a responsabilidade do sargento, que tinha acesso ao cofre. Dias depois, o capitão devolveu o envelope com o lacre violado e disse ao sargento que ele não deveria mencionar o acontecido. Em seguida, o também capitão R.F.F. pediu ao sargento que fizesse uma cópia da prova de Inglês para ele. Ambos os capitães já haviam sido reprovados três vezes no exame do idioma. Os fatos ocorreram no 20º Grupo de Artilharia de Campanha Leve, situado em Barueri (SP).

A violação do envelope foi detectada pelo tenente que aplicaria a prova e o exame de credenciamento do idioma foi cancelado. Instaurou-se Inquérito Policial Militar (IPM) para apurar os fatos. Preocupados com as investigações, os acusados passaram a coagir o 3º sargento e o tenente, orientando-os a contar uma versão diferente do ocorrido e obrigando o sargento a assumir a culpa. Os dois capitães foram denunciados por três crimes: concussão, violação de correspondência e coação, capitulados respectivamente nos artigos 305, 325 e 342 do CPM.

No julgamento de primeira instância, o Conselho Especial de Justiça da 2ª Auditoria de São Paulo absolveu M.M.B. e R.F.F. do crime de concussão, por não existirem provas suficientes para condenação dos acusados, de acordo com o que preceitua o artigo 439, alínea “e” do Código de Processo Penal Militar (CPPM). Entretanto, os réus foram condenados por terem infringido os artigos 325 e 342 do Códex.

Tanto a defesa quanto o Ministério Público Militar (MPM) apelaram da decisão. O órgão ministerial pediu a reforma da sentença no sentido de condenar os dois oficiais pelo crime de concussão e a majoração da pena para os outros crimes. Já os capitães pleitearam a absolvição.

Prescrição da punibilidade

Os advogados dos acusados, bem como o órgão ministerial levantaram a preliminar da extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva relativa ao crime de violação de correspondência, acolhida pelo ministro relator Raymundo Cerqueira. Os fatos descritos na denúncia ocorreram nos meses de abril e maio de 2006 e a denúncia só foi oferecida pelo MPM no final de junho de 2008.

“Considerando que o a pena máxima prevista para o crime é de seis meses, cuja prescrição ocorre em dois anos, consumou-se assim a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato. A preliminar é prejudicial ao mérito e deve ser declarada de ofício”, sentenciou o relator. Ele ressaltou que a denúncia contra o tipo penal nem deveria ter sido aceita.

O Plenário seguiu o voto do ministro por unanimidade. Assim, a sentença foi reformada e foi declarada extinta a condenação a dois meses de detenção pelo crime de violação de correspondência.

Coação

Já na apreciação do apelo da defesa pela absolvição dos acusados do crime de coação (artigo 342 do CPM), o relator considerou que a sentença de primeira instância deveria ser mantida. A coação consiste no uso de violência ou de grave ameaça para favorecer interesse próprio ou alheio. É praticada contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que participa ou intervém em inquérito policial, processo administrativo ou judicial militar.

Para o relator, a autoria e a materialidade do delito ficaram caracterizadas pelo conjunto de provas nos autos, já que os acusados passaram a constranger o sargento e o tenente.  A coação moral contra o primeiro foi mais evidente, na medida em que esse teria agido por medo de que os capitães pudessem prejudicá-lo, já que ocupava função temporária. O ministro Cerqueira sublinhou que a conduta dos réus foi marcada pelo dolo. Entretanto, denegou o aumento da pena, conforme pedido do MPM.

In dubio pro reo

Quanto ao crime descrito no artigo 305 do CPM, Cerqueira, entendeu que a prática da concussão não restou comprovada de forma suficiente. Para o Ministério Público, o crime de concussão ficou patente com a entrega da prova de Inglês, já que a aprovação no exame era condição preliminar para integrar a missão no Haiti, o que traria vantagens financeiras aos réus.

O crime de concussão é descrito como a exigência de vantagem indevida para si mesmo ou para outra pessoa, direta ou indiretamente, em razão da função ocupada.

O relator aplicou o princípio do in dubio pro reo - que significa “na dúvida, beneficia-se o réu” - e, com base no mesmo dispositivo legal utilizado pelo Conselho Especial de Justiça da 2ª Auditoria (art. 439 “e” do CPPM), negou provimento ao apelo da acusação.


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