Um cabo do Grupamento de Fuzileiros Navais foi condenado no Superior Tribunal Militar (STM) a mais de 13 anos de reclusão, por tentativa de homicídio qualificada. Ele atirou com um fuzil 7,62 mm, de uso exclusivo das Forças Armadas e de alto poder de fogo, contra um suboficial, também fuzileiro naval, colega de farda.

O crime ocorreu no dia 2 de dezembro de 2019, por volta das 23h horas, dentro do Moto Clube Águias do Norte, onde parte da tropa do Grupamento de Fuzileiros Navais do Rio de Janeiro estava aquartelada para o cumprimento da missão "Amazônia Azul".

Segundo a acusação feita pelo Ministério Público Militar (MPM), a tentativa de homicídio ocorreu após uma breve discussão entre ambos. O cabo teria chegado com amigos em um veículo, cujo som tocava muito alto, motivo pelo qual a vítima determinou à sentinela que mandasse o militar abaixá-lo. Mas a ordem que não foi atendida. Em seguida, o suboficial foi até o portão e ordenou pessoalmente ao réu a diminuição do som e que ele entrasse no quartel, imediatamente. O cabo atendeu, mas saiu proferindo palavras de baixo calão, dizendo que iria "tomar as providências dele".

Minuto depois, o cabo saiu de sua barraca com o uniforme camuflado, com a sua arma de serviço e colete balístico. Foi de surpresa pela parte de trás da barraca dos sargentos e efetuou o disparo, alvejando a vítima, sem qualquer chance de defesa.

Em depoimento, o suboficial contou que estava sentado na cama, conversando com um sargento, quando ouviu um engatilhar de uma arma. Só deu tempo de se virar de lado, quando foi brutalmente atingido no abdome. O suboficial sofreu ferimento nas costas, de grande impacto. Foi socorrido às pressas ao atendimento médico e precisou ficar internado por cerca de 30 dias. Por sorte, o tiro não atingiu qualquer órgão vital, apesar da grande ruptura e queimadura provocada.

O cabo foi denunciado à Justiça Militar da União (JMU), por tentativa de homicídio, com três qualificadoras: motivo fútil, com surpresa e em situação de serviço.

No julgamento de primeiro grau, na 1ª Auditoria Militar do Rio de janeiro, em 18 de agosto de 2020, o Conselho Permanente de Justiça, por unanimidade de votos, julgou procedente e condenou o réu à pena de 16 anos de reclusão, que deveria ser cumprida em estabelecimento prisional comum, em regime fechado.

A defesa do militar, inconformada com a decisão, entrou com recurso de apelação junto ao Superior Tribunal Militar (STM), em Brasília. Nos argumentos de defesa, pediu a desclassificação do crime de homicídio, na forma tentada, para lesão corporal culposa. Também requereu a anulação das qualificadoras e o recálculo da pena. Para argumentar sobre o crime culposo, disse que o seu cliente não quis matar a vítima. Ele teria passado por trás da barraca do sargento, quando tropeçou na corda do abrigo e efetuou o disparo sem querer.

A defesa pediu também que se concedesse ao apelante o regime prisional inicialmente aberto e o direito de recorrer em liberdade. Por fim, que ele cumprisse a pena no presídio militar enquanto perdurar o processo, em trâmite na 10ª Vara Federal do Rio de Janeiro, em que se pede a anulação da portaria de desligamento e sua reintegração às Forças Armadas, bem como o status de militar com todos os seus direitos e prerrogativas.

Ao avaliar o recurso da defesa, o ministro Artur Vidigal de Oliveira, manteve íntegra a condenação de primeiro grau, apenas retirando de uma das três qualificadoras do crime. Para o ministro, em nenhum documento e ou nos autos ficou demostrado e provado que o réu estaria de serviço. Por isso, decidiu por derrubar a qualificadora de “em situação de serviço”. Nos demais quesitos, manteve a condenação nos mesmos moldes decididos pela primeira instância da Justiça Militar da União, diminuindo a pena para 13 anos e quatro meses de reclusão, negando o cumprimento em presídio militar.

Para o relator, foi acertada a sentença que usou as qualificadoras do crime, de surpresa e valor ou o motivo fútil como agravante, juntamente com o emprego de arma de fogo.

“Contudo, embora se considere que o cálculo foi devidamente realizado, dentro dos padrões legais, reputo necessário proceder à correção com relação à qualificadora “estar de serviço”. Tal retificação se faz necessária porque, em que pese o entendimento do Ministério Público Militar e do Conselho Permanente de Justiça, ao compulsar os autos e me aprofundar na matéria de prova, tive dúvidas sobre o fato de o réu estar em serviço. Não se verifica nos autos a juntada de qualquer documento de escala de serviço que demonstrasse que o acusado estaria, de fato, de serviço. Nesse ponto, entendo que assiste razão à defesa em seu fundamento de que não basta apenas o militar estar no quartel, ou ter acesso (devido ou indevido) ao armamento, para se reputar que ele estivesse de serviço”, fundamentou o relator.

Segundo o ministro, esta é uma situação que precisa estar devidamente comprovada no processo e, no caso de dúvida, não pode ser usada para agravar a situação do acusado, em observância ao princípio do in dubio pro reo.  A corte acatou o voto do relator por unanimidade.

APELAÇÃO Nº 7000864-28.2020.7.00.0000


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