Advogado criminalista e jurista Técio Lins e Silva

Durante visita ao STM em que foi firmada uma parceria para a digitalização de áudios das sessões secretas da época do regime militar, o presidente do Instituto Brasileiro de Advogados Técio Lins e Silva concedeu entrevista em que relembra a sua trajetória como um dos mais efusivos advogados que atuaram na primeira instância da Justiça Militar da União e no Superior Tribunal Militar.

O criminalista Técio Lins e Silva advoga há mais de 40 anos em defesa da liberdade e da justiça no Estado brasileiro. No regime militar, iniciado na década de 60, foi um dos mais efusivos defensores de presos políticos, tanto na primeira instância da Justiça Militar da União, como no Superior Tribunal Militar.

Doutor em Direito Político, Lins e Silva foi Secretário de Justiça do estado do Rio de Janeiro, Conselheiro do CNJ, membro da comissão de juristas que elaborou o projeto do novo Código Penal e hoje preside o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB).

No início do mês o criminalista foi recebido pela presidente do Superior Tribunal Militar, Ministra Maria Elizabeth, quando concedeu uma entrevista ao Portal do STM. Na oportunidade, Técio Lins e Silva falou de sua trajetória de defesa de réus junto à Justiça Militar Federal, iniciada quando ele ainda tinha pouco mais de 20 anos de idade e de seu respeito por essa justiça especializada.

STM: Qual foi o motivo dessa visita do senhor ao Superior Tribunal Militar?

Técio Lins e Silva: Em primeiro lugar, rever um Tribunal que corre nas minhas veias, na minha emoção e onde durante mais de 20 anos eu advoguei aqui, intensamente. Foi a minha primeira defesa formal. Eu já tinha estreado no júri quando estudante, mas, como advogado, digamos assim, foi em 1968 defendendo um habeas corpus. E aí não parei mais, na época era quintanista. Então vinha ao Tribunal, venho e virei sempre e é uma satisfação rever esta Corte que me ensinou tanto e onde eu, enfim, deixei muitas emoções.

E, depois, vim para colaborar, contribuir e saber dos projetos que o Tribunal está realizando. Esse “Projeto Memórias”, de resgate da memória do Tribunal que a presidente Maria Elizabeth está realizando, eu quero aderir, ajudar e participar. O projeto de digitalização é de toda a memória da voz, das vozes, que estão postas e gravadas nos rolos de sessões. Como diz a presidente Maria Elizabeth, este é o único Tribunal do país que tem a gravação das vozes, as palavras dos jurisdicionados através dos seus advogados e é fantástico resgatar isso, é uma responsabilidade histórica.

O STM deixará para a história do país um registro extraordinário. E eu quero participar desse projeto como cidadão, como advogado militante e como presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, que é a mais antiga instituição jurídica das Américas e que nos seus 170 anos de existência tem também uma responsabilidade com a memória da Justiça Brasileira, a memória da história do Brasil, com a memória dos grandes acontecimentos que a nação viveu e que estão imbricados na história da Justiça e também da Justiça Militar.

STM:  Uma das vozes registradas é a do senhor que falou na sessão de inauguração deste Tribunal, aqui em Brasília, em 1973, não é mesmo?

Técio: Quando o Tribunal se instalou em Brasília, a sessão solene de inauguração, presidida pelo ministro presidente Almirante de Esquadra Valdemar de Figueiredo Costa, eu fui o primeiro orador a usar da tribuna. A mesma tribuna que sempre me emociona muito, porque é o mesmo móvel, a mesma madeira, que tem a mesma energia dessa justiça centenária. Dessa mais antiga justiça do Brasil. O ministro presidente, Valdemar Costa, me fez o convite para ser o primeiro orador. Então eu fui o primeiro a fazer a saudação na instalação do Tribunal em Brasília. Isso foi em fevereiro de 1973.

 

STM: O senhor guarda quais lembranças daquele momento?

Técio: Era o Regime Militar na sua fase mais dura, nos anos 70. E, enfim, eu tinha muita vontade de ouvir essa gravação porque o meu discurso foi pedir a volta do habeas corpus. É claro que fiz com delicadeza e com respeito à Corte, dizendo que não tinha sentido o país não ter habeas corpus, porque quem julgaria os habeas corpus, que estavam suspensos, era o Tribunal Militar que era uma Corte perfeitamente capaz, responsável e que não tinha nenhuma justificativa de não dar a ela essa capacidade. Estavam presentes todos os poderes, todo o poder da República, todo o poder Militar. Lembro que alguns militares viraram – a Tribunal ficava atrás das autoridades – eles viravam a cabeça para ver quem estava falando, quem era aquele garoto audacioso que falava. Gostaria de ouvir esse discurso e tantos outros. Fiz muitas defesas, muitas. Esse arquivo de voz tem aí meus reclamos, meus brados, meu choro. Tem a minha emoção defendendo os perseguidos políticos e os meus clientes, todos inocentes porque eu não defendo culpados.

STM: Há algum caso específico que o senhor se lembra de ter sido julgado pelo STM?

Técio: O mais expressivo foi o habeas corpus que defendi quando estreei aqui, no dia 16 de maio de 1968. Era um habeas corpus impetrado pelo meu pai e estava em mesa para ser julgado numa quarta-feira seguinte à morte dele. As sessões de habeas corpus eram julgadas às quartas-feiras e ele tinha morrido. Tinha deixado esse habeas corpus impetrado. Entrou em mesa e eu vim sustentar no lugar dele. Foi talvez a defesa mais difícil e mais emocionante. A partir daí eu não parei mais de defender no Tribunal, no Pleno e nas Auditorias Militares.

STM: O senhor se recorda dos detalhes?

Técio: Foi o caso dos arquitetos de Belo Horizonte, do Conselho de Arquitetura. Era um processo absolutamente sem nenhuma relevância. Era uma acusação genérica de subversão, de serem apenas contra o governo. Não tinha nenhum ato. Enfim, era um processo tipicamente político, inútil e o Tribunal, unanimemente, arquivou, ou seja, concedeu a ordem de habeas corpus para trancar a ação penal por falta de justa causa.

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