Após uma discordância entre o relator do processo e um dos ministros sobre o enquadramento no crime de abandono de posto, a corte do Superior Tribunal Militar (STM) votou pela condenação de um ex-sargento do Exército a nove meses de detenção.

O ex-militar responderá não só pelo crime do art. 195 do Código Penal Militar (CPM), mas também pelo de prevaricação, previsto no art. 319 do mesmo Código.

As condutas praticadas ocorreram em março de 2018, data em que o ex-sargento estava “de serviço” como rondante do 9º Batalhão Logístico (9º B Log), situado em Santiago (RS).

Naquela data, por volta de meia-noite, o então sargento avisou à sentinela da guarda que chegaria um carro no quartel. Embora o procedimento seja de anotar todos os veículos que adentram a organização militar (OM), naquele caso, frisou o sargento, não era para ser feita a identificação.

Conforme alertou o ex-militar, o veículo chegou sendo conduzido por uma senhora, entrou no quartel, parou na guarda para que o rondante pudesse entrar e seguiu para o estacionamento do quartel, ficando estacionado lá por cerca de uma hora.

Por causa da conduta, o sargento foi denunciado pelos crimes de prevaricação, assim definido no CPM: retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra expressa disposição de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.

O Inquérito Policial Militar (IPM) também entendeu que ele cometeu o crime de abandono de posto.

O acusado foi julgado em outubro de 2019 pelo Conselho Permanente de Justiça (CPJ) para o Exército. Por maioria, os juízes julgaram procedente a denúncia para condenar o ex-3º Sargento à pena de nove meses de detenção, concedendo-lhe o benefício do sursis pelo prazo de 2 (dois) anos, com a fixação do regime aberto para o início do cumprimento da reprimenda e o direito de recorrer em liberdade.

Inconformada com a sentença, a defesa recorreu ao STM solicitando a improcedência da denúncia e a consequente absolvição do acusado.

O advogado informou que a responsabilidade pelo ocorrido seria da sentinela da hora, soldado que ocupava o posto na guarita, uma vez que o mesmo permitiu a entrada de um veículo sem identificação ao quartel, uma ordem considerada absurda pelos regulamentos.

A defesa sustentou, ainda, que o apelante não teria cometido crime algum, apenas incorrido em transgressões disciplinares, uma vez que o mesmo permaneceu durante todo o serviço no interior do quartel. Enfatizou que não existem normas que determinem o horário preciso para o registro da passagem pelo rondante nos pontos de itinerário.

Finalmente, alegou a demonstração da inexistência de qualquer vantagem ou proveito próprio pela prática do suposto crime de prevaricação.

Posicionamento do relator

O ministro relator do processo, William de Oliveira Barros, deu parcial provimento ao apelo defensivo quanto ao crime de abandono de posto. O magistrado julgou que o fato descrito não encontra adequação típica formal no art. 195 do CPM e entendeu que o apelante cumpriu suas atribuições de rondante, mesmo com a interrupção para a conversa mantida dentro do veículo.

“Vale dizer que, além de o ex-sargento não ter se ausentado do quartel, esteve a todo tempo sob os olhares dos militares que se encontravam no portão da guarda, a uma distância aproximada de cem metros.

Ressalta-se que a função de rondante abrange todo o interior da Organização Militar (OM), pois o apelante não tinha ponto fixo e determinado para o cumprimento de sua função. Daí emerge o entendimento que, mesmo no estacionamento onde se encontrava, estava em seu local de serviço”, frisou o relator, que, embora tenha inocentado o ex-militar quanto ao abandono de posto, manteve a condenação quanto ao crime de prevaricação.

Posição divergente

Em voto divergente daquele emitido pelo relator do processo, o ministro Marco Antônio de Farias externou sua discordância em relação à absolvição do militar pelo crime de abandono de posto. “No que concerne ao crime de prevaricação, o voto do relator transborda em argumentos para que a condenação seja mantida, pouco havendo a aduzir à sua rica fundamentação.

No entanto, o agente deveria ter realizado, como rondante, a supervisão, o controle e a fiscalização dos postos da guarda externa e dos serviços internos da OM, nos termos do regulamento”, frisou o magistrado.

O ministro Farias continuou argumentando em seu voto os motivos que o levaram a entender também pelo crime do artigo 195, explicando que o réu não só ordenou que um subordinado deixasse adentrar ao quartel uma estranha, como também desprezou totalmente as regras de segurança, pondo em perigo a OM e todos ali presentes.

“O referido militar não tem o direito, nem o plano de segurança do quartel pode tolerar que o agente se encerre num veículo durante a sua ronda, deixando pairar toda a sorte de dúvidas sobre o acontecido em seu interior. No caso de absolvição, seria criado grande desnível no quadro da jurisprudência deste Tribunal Superior”.

“Não se poderia enrijecer em relação aos soldados e, desproporcionalmente, relevar conduta semelhante praticada pelos mais antigos e graduados, os quais devem ser motivo de exemplo no bojo da segurança das OM.

O rondante é a sentinela móvel. Logo, além de ser desempenhada por militar mais antigo, justamente porque fiscaliza a conduta dos demais guardas, estabelece a ligação entre os postos, tudo para fortalecer o elo da segurança do quartel”, ressaltou.

O ministro votou pela condenação nos crimes previstos nos artigos 195 e 319 do CPM, sendo seguido pelos demais magistrados, o que manteve a condenação do ex-sargento a uma pena de nove meses de detenção.

APELAÇÃO Nº 7001373-90.2019.7.00.0000


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