A condenação de um tenente reformado da Aeronáutica foi mantida pelo Superior Tribunal Militar (STM) após o oficial ser submetido a julgamento por estelionato, crime previsto no artigo 251 do Código Penal Militar (CPM). Durante 28 anos, o militar recebeu indevidamente o benefício do auxílio por invalidez da Administração Pública, ao mesmo tempo em que continuava a exercer atividade laboral em instituições privadas como médico.
O militar ingressou na Força Aérea em 1985 para a função de tenente médico temporário. No entanto, três anos depois, foi desligado da instituição após ser julgado incapaz para o serviço de forma definitiva.
Na ocasião da sua reforma, segundo consta na denúncia apresentada pelo Ministério Público Militar (MPM), o tenente tinha ciência de que não poderia exercer nenhum tipo de atividade remunerada, quer pública ou privada. Ainda segundo consta no documento, o médico manteve a administração pública em erro, já que anualmente assinava uma declaração de que não exercia nenhuma atividade remunerada pública ou privada.
Argumentos da defesa
A defesa constituída pelo réu argumentou que desde 2010 o tenente tem interesse em ressarcir ao erário as quantias recebidas. Diante disso, solicitou perícia contábil para realizar uma aferição dos valores que deveriam ser pagos. Também demonstrou que foi assinado por ele um termo de reconhecimento da dívida, o qual autorizava desconto dos valores em folha de pagamento, documento confirmando posteriormente pela Aeronáutica. Baseada nesses argumentos, a defesa pediu a absolvição do réu, pedindo que em caso de reconhecimento de culpa fosse a pena transformada em punição disciplinar.
O julgamento em primeira instância ocorreu em novembro de 2017 na 3ª Auditoria da 1ª Circunscrição Judiciária Militar, localizada no Rio de Janeiro. Na ocasião, o réu foi condenado a uma pena de três anos de reclusão convertida em prisão, a ser cumprida em regime inicialmente aberto.
Voto e divergência
O julgamento do médico teve como relator o ministro Francisco Joseli Parente Camelo, que julgou improcedente o pedido da defesa de aplicação do princípio da intervenção mínima para absolver o réu. Como explicou o relator, dado o acentuado desfalque aos cofres públicos não era possível vislumbrar a aplicação de tal princípio jurídico. O ministro, no entanto, entendeu ser viável reformar a sentença de primeira instância e aplicar a pena base no mínimo legal, o que somou dois anos de reclusão com o benefício do sursis.
“O médico é tecnicamente réu primário, com bons antecedentes e mostrou-se arrependido face ao ilícito penal, tanto que se propôs espontaneamente a ressarcir o quanto antes os cofres públicos. Ademais, embora o colegiado tenha salientado na sentença a extensão do dano causado como fundamento da elevação da pena-base, melhor interpretação merece ser dispensada a fim de se coadunar com os critérios de proporcionalidade”, ressaltou o magistrado.
O revisor do processo, ministro Péricles Aurélio Lima de Queiroz, fez voto divergente pela manutenção da pena em três anos, sugerindo, inclusive, que após o trânsito em julgado da sentença o processo fosse enviado ao Ministério Público Militar para um juízo sobre o cabimento de uma representação para de perda de posto e patente.
O ministro revisor foi seguido por metade da corte em seu posicionamento, o que fez a votação terminar empatada. Coube ao ministro que presidia a sessão decidir através do exercício do voto de minerva, o qual estabelece que em caso de empate, o voto de desempate do presidente deve ser a favor da sentença mais benéfica ao réu.