Cezar Roberto Bittencourt também comentou sobre inovações da lei penal
Legislação de crimes contra a dignidade sexual não está totalmente adaptada à realidade social do Brasil
O professor e doutor em Direito Penal Cezar Roberto Bittencourt acredita que a legislação brasileira avançou em relação aos crimes contra a dignidade sexual, entretanto, ela ainda continua “hipócrita” em certos aspectos. Ele foi um dos palestrantes do Seminário de Direito Penal e Processual Penal Miliar, que acontece na sede da 1ª CJM no Rio de Janeiro.

O especialista comentou algumas inovações da lei penal referente aos crimes contra a dignidade sexual, como a introdução do crime de assédio sexual e o novo entendimento do estupro. Anteriormente, estupro era descrito apenas como conjunção carnal e havia outro tipo penal, o atentado violento ao pudor. Essa última figura desapareceu e foram unificadas sob a primeira.

Bittencourt ressaltou que o bem jurídico tutelado nesse tipo de crime não é a moral sexual, mas é a liberdade sexual da mulher e do homem, que é o direito que ambos têm de exercer livremente a sua sexualidade. Liberdade essa de escolher não somente com quem, mas igualmente como, onde e porque exercê-la.

O professor afirma que em relação a gravidade dos crimes violentos contra a dignidade sexual, a legislação brasileira é satisfatória. Por outro lado, continua cometendo alguns “equívocos”. O Código Penal, por exemplo, pune o relacionamento sexual com pessoas com mais de catorze e menos de dezoito anos, mesmo sem violência.

“Outra coisa que me parece totalmente ultrapassada é criminalizar a prostituição. A rigor, ser prostituta não é crime, mas qualquer coisa que se tenha para facilitar o trabalho dela é crime. Então, ela é condenada a ser explorada por alguém, morar em lugares insalubres, impedindo que tenha uma vida mais regular”.

Bittencourt ressaltou a importância do bem jurídico defendido por esse tipo de legislação, já que os crimes sexuais ferem a liberdade e a dignidade da pessoa. “Não tem sentido falar em dignidade humana sem falar da dignidade sexual, na liberdade do exercício da própria sexualidade”.

O especialista ressaltou que o sexo é um dos atributos mais valiosos da natureza e tem a capacidade de trazer alegria e fazer com que os seres humanos sejam melhores. “Entretanto, ele só tem essa capacidade quando o exercício da sexualidade é voluntário, consentido, desejado e quando a prática é saudável. Não há nada mais degradante, mais demolidor que a violência sexual. As outras violências são superadas, mas essa não, porque atinge a dignidade, o âmago de cada um, a intimidade”.

José Couto abordou peculiaridades do Código Penal Militar no quarto dia de Seminário
Direito Penal Militar trouxe inovações à legislação comum
O direito penal militar ofereceu contribuições importantes à legislação penal comum em nosso país. Esse foi o mote da palestra de abertura do quarto dia de Seminário de Direito Penal e Processual Penal, que acontece na sede da 1ª CJM no Rio de Janeiro. O expositor, José Carlos Couto de Carvalho, subprocurador-geral aposentado da Justiça Militar da União, destacou as inovações da legislação penal militar no ordenamento jurídico.

José Carlos Couto explicou que em 1969, duas comissões foram formadas para reformar os Códigos Penal e Penal Militar. Entretanto, apenas o último entrou em vigor. “O CPM teve a primazia de introduzir uma série de disposições que trouxeram avanços ao Direito. Alguns colegas que não conhecem o CPM ficam impressionados quando comento sobre algumas figuras que temos no Código”, afirmou.

A principal delas se encontra no artigo 34 do CPM. Esse artigo afastou de vez a responsabilidade objetiva do direito penal militar, ao estabelecer que “pelos resultados que agravam especialmente as penas só responde o agente quando os houver causado, pelo menos, culposamente”. Tal inovação só passou a constar no Código Penal comum com a reforma da parte geral em 1984.

Outra inovação do CPM diz respeito à periculosidade. No Código Penal Militar, ela é real, deve ser verificada pelo juiz para aplicação de medida de segurança para inimputáveis, de acordo com o artigo 112. Já a legislação comum determina que se o agente é inimputável, o juiz determinará sua internação (artigo 97 do Código Penal).

O professor de Direito Penal Militar ponderou que o Código necessita de atualizações para se adaptar ao novo ordenamento jurídico nacional, já que data de 1969. Ele integra a Comissão criada no STM para revisar a legislação penal militar. O subprocurador informou que a parte referente ao CPM já foi concluída e agora os integrantes passaram ao estudo do Código de Processo Penal Militar.

Justiça Militar assegurou o pleno exercício da advocacia, disse criminalista
Técio Lins e Silva: STM e Auditorias garantiram direitos no período mais duro do regime militar

A primeira palestra da tarde desta quinta-feira (18) foi uma viagem ao passado. Especificamente, aos anos em que o país viveu o período mais rígido do regime militar. E o que se viu e ouviu foi um advogado emocionado, relembrando seu início de carreira, que aconteceu dentro da Justiça Militar da União. O advogado é Técio Lins e Silva, conhecido criminalista brasileiro.

“Confesso a emoção de voltar a esse foro militar, onde aos 21 anos de idade, eu estreei na tribuna”, disse Técio Lins. O ano era 1968. Nessa época, a sede do STM ainda funcionava no Rio de Janeiro.

O julgamento dos acusados de infringirem a Lei de Segurança Nacional era de responsabilidade da JMU. “Eram tempos politicamente difíceis, nós atendíamos muitos clientes gratuitamente, os perseguidos políticos. E o papel que a JMU desempenhou nesses 20 anos de regime foi o de garantir o papel da defesa e a honradez no exame dos processos e na aplicação da lei”, asseverou.

O advogado continuou: “A JMU jamais compactou com a violência, nem com ilegalidades. Foi absolutamente independente e legalista. Habeas corpus eram concedidos e trancavam ações penais, por exemplo”, sublinhou.

Então veio o Ato Institucional Número 5 e junto com ele, o período mais duro do regime, suspendendo a concessão de habeas corpus. “O que nós fazíamos? Fazíamos uma petições, sem colocar o nome de habeas corpus e o STM tinha essa sensibilidade de atender nossos pedidos de informações”, lembrou o advogado.

“O exercício da advocacia era extremamente respeitado e pleno. Nunca deixei de ser recebido por nenhum ministro para entregar memorial. Eu me sentia mais seguro no STM do que na rua. O acesso aos autos nas auditorias era democrático, eficiente, honesto. Tudo feito na lisura. Nós, todos os advogados, temos a opinião de que o STM e a auditorias foram um marco, uma garantia no período militar em sua fase mais dura”, afirmou.

Técio Lins e Silva defendeu a Justiça Militar da União como parte essencial na manutenção da democracia no país, tanto pelo seu histórico, quanto pelo seu papel atual. “Ela julga uma parcela bastante especializada de agentes públicos de forma célere e justa, guardando os princípios constitucionais da hierarquia e disciplina”, concluiu.

A comissão de notáveis que elaborou o anteprojeto chegou à conclusão de que a matéria de direito militar é muito específica e que o melhor seria ela ter um tratamento especial em código penal próprio. A previsão é que o Senado aprecie o projeto de lei ordinária do novo código penal no segundo semestre deste ano.
Novo Código Penal deve ser apreciado no Senado ainda este ano
O projeto de lei ordinária do novo código penal brasileiro deve ser apreciado pelo Senado Federal ainda este ano. Esta é a expectativa do desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro José Muiños Piñeiro Filho, um dos integrantes da comissão de notáveis escolhidos para elaborar o anteprojeto de lei.

Depois da apresentação do anteprojeto, o Senado Federal criou uma comissão especial, sob relatoria do senador Pedro Taques, que está no estágio de audiência públicas, com previsão de votação ainda no segundo semestre deste ano.

Segundo José Muiños Piñeiro o projeto prevê muitas mudanças. Uma delas é revogação de mais de cem leis penais, a exemplo da parte penal do estatuto da criança e do adolescente; do estatuto do desarmamento; da lei de drogas e do código ambiental.

Segundo entendimento da comissão de juristas, o emaranhado de leis penais cria toda uma sistemática que prejudica a aplicação da lei e cria distorções para a própria justiça. “O novo código penal passará a ter no máximo a vinte leis penais”, afirma Piñero.

O projeto também descriminaliza muitas condutas. “Hoje temos quase dois mil crimes previsto no código. O projeto reduz isso para pouco mais de oitocentos tipos”. O magistrado diz que a revogação não é uma simples uma descriminalizão generalizada. “Tornamos relevante no âmbito penal aquilo que a sociedade quer realmente reprimir. Foram retiradas muitas contravenções que não tem mais razão de ser”.

O novo código penal também vai dar um relevo especial à vítima. Segundo o jurista, porque a própria constituição só cita a vítima de um crime em seus artigos finais, e apenas para efeito de criação de um fundo de proteção. “Na comissão nós reivindicamos que a vítima fosse especialmente citada no código penal, o que não acontece na lei atual.
E mais, que o juiz, quando condenar alguém nos crimes dolosos contra a vida, terá que analisar as consequências para a vítima ou para seus familiares e que será levado em conta para aplicação, além de se poder fixar alimentos em favor das vítimas ou seus familiares”, informa.

Código Penal Militar preservado

A Comissão de notáveis escolhida para criar o novo código penal brasileiro resolveu não revogar o Código Penal Militar e também não incorporá-lo ao novo texto do código penal comum . O desembargador disse que a comissão chegou à conclusão de que a matéria militar é muito especifica e que melhor seria ela ter um tratamento especial. “ A vida militar, a vida castrense tem peculiaridades que a legislação comum não deve tocar, sob pena de se criar situações complicadas à simetria”, afirma.

Sobre uma possível extinção da Justiça Militar, o jurista diz ser inteiramente contra. “O que me parece é que a crítica que está sendo feita é sobre questões estruturais, de números de processo, ampliação ou não de tribunais. Isso a meu ver é periférico, como é para justiça federal e estadual”. Segundo ele, a justiça militar tem que ter um tratamento diferenciado e privilegiado pela sua peculiaridade. “Eu sou contra aqueles que acham que não deve existir uma justiça militar”.
Ações

Maria Elizabeth Rocha defende reforma da lei penal militar e ampliação da competência da JMU. Ela também acredita que as militares agredidas no contexto doméstico por companheiros militares devem ser protegidas pela Lei Maria da Penha.
O Código Penal Militar deve recepcionar novos dispositivos da legislação comum
O último dia do Seminário de Direito Penal e Processual Militar, que acontece no Rio de Janeiro, foi aberto pela ministra do Superior Tribunal Militar, Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha. Ela preside a Comissão de Reforma do Código Penal Militar formada no STM com representantes diversos ramos do Direito. A magistrada falou sobre as alterações que serão propostas pela comissão.

A ministra defende a ampliação da competência da Justiça Militar da União para processar as infrações disciplinares cometidas por militares. “Trata-se de uma unificação por pertinência temática. Tanto o crime militar quanto a infração disciplinar ferem os princípios basilares da hierarquia e da disciplina. A Justiça Militar da União é quem detém o conhecimento técnico para processar ambos. Além disso, as justiças militares estaduais já julgam esse tipo de infração, o que cria uma jurisprudência dupla”, justifica. Atualmente, a Justiça Federal é responsável por julgar tais infrações.

Outro ponto abordado foi a possibilidade da transposição de leis extravagantes ao CPM, por meio de uma alteração do artigo 9 do diploma legal. Dessa forma, seria possível trazer a lei dos crimes hediondos e de crimes ambientais, por exemplo, para a legislação penal militar, sem a necessidade de se fazer alterações sucessivas no texto do Código.

A comissão também defende a realização de interrogatórios por videoconferência, o que já é permitido pelo Código de Processo Penal comum. “Nós não temos Auditorias em todos os estados e é de interesse do próprio réu, que muitas vezes é hipossuficiente e se encontra longe do seu juiz natural".

A ministra sustentou a utilização da medida somente em casos excepcionais e justificados, visando assegurar a legítima defesa e o devido processo legal, bem como a rápida prestação judiciária.

Lei Maria da Penha

Outro ponto importante abordado pela magistrada foi a violência contra mulheres militares cometida por maridos ou companheiros também militares dentro do âmbito do lar. Ela ponderou que a participação feminina dentro das Forças Armadas vem aumentando, assim como as relações afetivas entre militares.

“Eu defendo com veemência que o fato das mulheres integrarem a carreira militar não impede que sejam vítimas de agressão por companheiros militares dentro de casa. No âmbito do lar, a lei Maria da Penha deveria ser aplicada - não o CPM, como lesão corporal - e o foro declinado para a justiça comum. Estamos criando duas categorias de mulheres, já que a Lei Maria da Penha prevê punições muito mais rígidas contra os agressores”, salientou a ministra.

As conclusões da Comissão de Reforma do Código Penal serão apresentadas ao Plenário do STM e posteriormente, enviadas como sugestão ao Congresso Nacional. A comissão que proporá mudanças ao Código de Processo Penal Militar será presidida pelo ministro Artur Vidigal de Oliveira.

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