O Superior Tribunal Militar (STM) mudou a sentença de primeira instância e condenou um coronel e um major do Exército, irmãos, por fraude em concurso. Ambos foram condenados por violação do sigilo funcional, crime previsto no artigo 326 do Código Penal Militar. O coronel vazou as provas e os gabaritos do concurso de admissão à Escola de Comando e Estado-Maior (ECEME), uma das mais prestigiadas escolas do Exército e que propicia acesso aos mais altos postos da hierarquia militar.
Segundo o Ministério Público Militar, em 2011, durante a correção das provas do concurso de admissão à ECEME, os instrutores estranharam a semelhança das repostas de um candidato, identificado por um número, com os baremas oficiais. As respostas eram idênticas às anotadas pelos instrutores, inclusive as subjetividades. Diante da impossibilidade de um candidato responder com tamanha precisão e semelhança, tornou-se evidente a ocorrência de fraude.
Os instrutores procuraram o chefe da Seção de Preparação e Seleção, o coronel L.P.A para comunicar a possível fraude. No entanto, antes mesmo de ser identificado o militar beneficiado, o coronel informou que a prova pertencia ao seu irmão, o major E.P.A, reconhecendo a letra do oficial.
Ainda conforme o Ministério Público, todos os integrantes da comissão do concurso assinam termo de sigilo que proíbe a saída do quartel de qualquer material referente às provas. Mas o coronel acusado, chefe da seção, quebrou a regra e levou para casa, em um pen-drive, todas as provas e respectivos gabaritos e baremas.
Em depoimento, após a abertura de uma sindicância, o oficial disse que levou o material para casa em virtude do acúmulo de serviço. Porém, foi justamente no mesmo fim de semana em que seu irmão, o segundo o acusado, que servia em um quartel na cidade de Porto Alegre, se deslocou até a cidade do Rio de Janeiro para visitar a família.
Cerca de 600 oficiais o Exército, entre capitães, majores e tenentes-coronéis, estavam inscritos e concorreriam às 120 vagas do certame. Ainda segundo depoimento do coronel, seu irmão teve acesso ao seu notebook que continha os arquivos da prova. Em processo administrativo, o coronel reconheceu que quebrou a regra de sigilo ao levar o material para casa, mas negou que tenha vazado. Sem justificativa, foi punido administrativamente pelo comandante da ECEME, com dois dias de cadeia.
No processo criminal, ocorrido na 3ª Auditoria da Circunscrição Judiciária Militar (CJM) do Rio de Janeiro, ambos os oficiais negaram o crime. O major afirmou que não teve acesso aos baremas e que respondeu conforme seu conhecimento, adquirido nas longas horas de estudo. No julgamento de primeira instância, o Conselho Especial de Justiça reconheceu o erro dos militares, mas os absolveram por falta de previsão legal no Código Penal. Inconformado com a decisão, o Ministério Público recorreu ao STM, requerendo a condenação dos acusados.
Ao analisar o recurso, o ministro relator, Fernando Sérgio Galvão, votou pela condenação dos dois oficiais. Segundo o ministro, o coronel descumpriu o compromisso de manutenção de sigilo e que o major teve acesso, com antecedência aos baremas, pois nas respostas do candidato foram identificados expressões subjetivas, percentuais e sequências de ideias dos elaboradores da prova, o que culminou com a suspeita de vazamento.
Ainda de acordo com o magistrado, a ECEME forma os chefes militares do Exército, sendo considerado centro de excelência pelo próprio Exército e no meio civil acadêmico, nacional e estrangeiro, inclusive com grande número de alunos militares de outros países. Ele disse que o vazamento colocou em risco a credibilidade da instituição. “É um concurso difícil, concorrido e que prepara oficiais para o topo da carreira militar. Trata-se de um coronel experiente, ocupando importante função de chefe da seção de concurso e sabedor da importância de se manter o sigilo das informações”.
Por unanimidade, os ministros condenaram o coronel à pena de um ano de detenção, e, por maioria, o major beneficiário do vazamento, por co-autoria, à pena de seis meses de detenção. Ambos foram beneficiados pelo "sursis" – suspensão condicional da pena - pelo prazo de dois anos.