O penalista Luiz Flávio Gomes disse que o Instituto da Delação Premiada é Constitucional, inclusive com amparo da Corte Alemã

“As 33 delações premiadas ocorridas no âmbito da Operação Lava Jato até agora realizadas são constitucionais”, afirmou Gomes. Isso porque, no Brasil, o instituto da deleção premiada exige um processo onde o direito de defesa é preservado, tal como ocorre no sistema judiciário europeu, de onde o instituto foi reproduzido.    

A afirmação foi feita na manhã desta quinta-feira (22) durante o XII Seminário de Direito Militar promovido pelo Superior Tribunal Militar, durante a palestra “As garantias mínimas no processo criminal previstas no pacto de San Jose da Costa Rica e seus reflexos no Direito Brasileiro”.

O professor Gomes ratificou a sua posição afirmando que se o Brasil tivesse se inspirado na aplicação do instituto seguindo o sistema norte-americano, “haveria sim uma inconstitucionalidade na aplicação das delações premiadas”.

Nos Estados Unidos, a confissão do réu liquida o processo já que derruba a culpabilidade. No sistema europeu, o qual nós seguimos, a delação se vincula à produção de provas, o que exige um processo. “Esse processo exigido no Brasil salva a constitucionalidade da delação premiada”, afirma o professor.

Para o jurista, no que diz respeito às garantias e ao Pacto de San José, a delação premiada é a maior revolução probatória da história do Brasil. E, segundo ele, há duas decisões que respaldam essa constitucionalidade: a da Corte Constitucional alemã, que decidiu serem as delações aplicadas no país constitucionais, e a do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que também avaliou constitucionais todas as delações premiadas na Europa.  

Ele explicou ainda que o instituto da delação premiada existe no país desde a década de 90, mas que só em 2013, a partir da lei do Crime Organizado, houve especificação de regras para a aplicação do instituto.

No século XXI a lei deve ser sempre aplicada em favor dos direitos e da liberdade

Esse foi um dos exemplos que o penalista apresentou para ressaltar a importância da atuação do magistrado com base em um espectro muito mais amplo de informações que condicionam as decisões jurídicas.

Segundo o professor, o juiz atualmente precisa pautar o seu trabalho em oito fontes: as normas infralegais, as normas legais, a Constituição, a jurisprudência constitucionalizada, os tratados internacionais, a jurisprudência interpretativa dos tratados, o direito supra constitucional e as normas imperativas exaradas pela Organização das Nações Unidas.

Gomes explicou que o magistrado hoje tem de escolher a norma que aplicará ao caso concreto. Mas, com isso, uma nova questão se coloca: que norma tem preferência na aplicação? Em 2008, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu uma hierarquia para as normas jurídicas, em que os tratados internacionais estão abaixo da Constituição Federal, salvo se referirem aos direitos humanos aprovados com quórum especial de três quintos, em dois turnos, na Câmara e no Senado.

Porém, segundo o professor, o mundo do direito internacional está regido por outra lógica - e não da hierarquia das normas -, que vem expressa em um princípio central: pro homine, pelo qual a lei é sempre aplicada em favor dos direitos e da liberdade. “Assim, se o juiz encontrar uma norma internacional que favoreça à liberdade mais que a Constituição, ele deve aplicar essa norma”.    

Com base nesse princípio, o próprio Supremo Tribunal Federal decidiu pelo fim da prisão civil do depositário infiel, seguindo a norma internacional. Mesmo prevista na legislação brasileira, esse tipo de prisão deixou de ser aplicada no Brasil em obediência ao Pacto de San José da Costa Rica, tendo permanecido a possibilidade de prisão somente no caso de obrigação alimentícia. 

Em sua exposição, Luiz Flávio Gomes considerou ainda que há conflitos na aplicação das normas internas e internacionais. Como exemplo ele citou a audiência de custódia, prevista no artigo 293 do Pacto e já aplicada em todos os países sul-americanos, mas que no Brasil ainda há resistências em adotá-la.

Outro exemplo que demonstra essa dificuldade em aplicar a legislação internacional, mesmo sendo o Brasil um signatário de vários tratados, segundo o professor, foi o julgamento do Mensalão pelo STF. Para o professor não há dúvidas de que ali ocorreu um grande problema: não se observou o grau de dupla jurisdição a que os réus têm direito, previsto também no Pacto de San José e pacificado pela Corte Interamericana com o julgamento conhecido como Las Palmeiras.

Segundo ele, dos 27 países da Organização dos Estados Americanos, 14 já resolveram esse problema de autoridades julgadas em foros privilegiados, pela prerrogativa de função. Nesses países, a Corte Suprema foi dividida em Turmas, tendo o Recurso decidido pelo Pleno, atendendo então à garantia do segundo grau de jurisdição.

Ele avalia que um passo já foi dado neste sentido com a Operação Lava Jato, quando a Segunda Turma do STF é responsável por julgar os réus que tem foro na Suprema Corte, porém não previu o recurso para o Pleno, “indispensável", segundo o professor Luiz Flávio Gomes.

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Ministro do STM José Coêlho e o ministro do STF Dias Toffoli

Neste terceiro dia do XII Seminário de Direito Militar, o ministro do STF Antônio Dias Toffoli discorreu sobre a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) ao julgar matérias relacionadas ao Direito Penal Militar.   

Ao abrir a palestra, o ministro afirmou ser defensor da razão de ser da Justiça Militar como justiça especializada. Segundo ele, os valores da hierarquia e da disciplina, próprios da vida militar, geram uma situação diferenciada que justifica a existência de um Direito Penal Militar.

Também disse ser positivo o fato de a Justiça Militar da União (JMU) no Brasil estar inserida no Poder Judiciário ao contrário do que ocorre em outros países. Em seguida explicou a missão constitucional da Justiça Militar da União e falou sobre sua organização e funcionamento.

O palestrante abordou a questão da aplicação do interrogatório aos réus que respondem a processos de natureza militar. A partir de 2008, uma modificação no artigo 400 do Código de Processo Penal comum determinou a realização do interrogatório ao final do processo. O Código de Processo Penal Militar (CPPM), por sua vez, prevê que o interrogatório deve ser o primeiro ato da instrução processual.

No Supremo Tribunal Federal, as turmas divergem sobre o assunto: a primeira turma entende que a previsão do artigo 400 deve também ser válida ao processo judicial militar; já a segunda turma do STF defende que, pelo princípio da especialidade, deve prevalecer a redação da lei processual penal militar.

O ministro Toffoli lembrou que a jurisprudência da Justiça Eleitoral foi no sentido de estender a seu rito todas as inovações legislativas em favor da defesa do réu, incluindo a alteração no artigo 400,  para evitar questionamentos futuros de suas decisões.

Julgamento de civis

O julgamento de crimes praticados por civis durante as operações de Garantia da Lei e da Ordem também foi tema da exposição. É o caso dos crimes de desacato ou furto de armamento, por exemplo.

Dias Toffoli afirmou que a primeira turma do STF tem confirmado a competência da Justiça Militar para apreciar esses casos, em detrimento da Justiça Federal. Já a segunda turma tem entedimento diferente e a questão dever ir a plenário daquela Corte Suprema para uma decisão. 

O ministro lembrou que aguarda julgamento no Plenário do STF uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) questionando a tipificação do crime de “pederastia”, previsto no artigo 235 do Código Penal Militar. A ação, encaminhada pela Procuradoria-Geral da República, defende que a nomenclatura é reflexo de uma moral ultrapassada que criminalizava os atos homossexuais e ressalta que qualquer irregularidade cometida no ambiente de trabalho deve ser julgada sem distinção.

Outros assuntos em discussão no Supremo também foram tratados na palestra, como a constitucionalidade da prisão militar em caso de transgressão disciplinar e a possibilidade de descriminalização das drogas.

Nesse último caso, o magistrado afirmou que deve se manter a tendência do tratamento diferenciado para a criminalização do consumo de entorpecentes nos quartéis, mesmo que em pequena quantidade.

Para isso, lembrou que esse entendimento já foi sedimentado pelo Plenário do STF, ao decidir pela não aplicação do princípio da insignificância nessas hipóteses.  

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O Superior Tribunal Militar realiza esta semana o XII Seminário de Direito Militar. O evento, que ocorre de 19 a 22 de outubro, pode ser visto AO VIVO. O seminário é organizado pelo Centro de Estudos Judiciários da JMU (CEJUM) sob a coordenação do ministro do STM José Coêlho Ferreira, e será realizado no auditório do Superior Tribunal Militar, em Brasília. 

Para conferir a programação, clique aqui.

O Seminário tem o propósito de atualizar e aprimorar os operadores do Direito, principalmente do Direito Militar, por meio de palestras e debates envolvendo temas afetos às rotinas de trabalho de magistrados e servidores.

A capacitação constará de 32 horas aula e é voltada para juízes-auditores e juízes-auditores substitutos, membros do Ministério Público Militar (MPM), assessores jurídicos do STM e do MPM, servidores da JMU e do MPM, representantes das Forças Armadas.

As inscrições já foram encerradas, no último dia 2 de setembro. Para acessar a lista de deferidos, clique aqui.

As vagas não aproveitadas pelas Instituições às quais foram originariamente destinadas poderão, a critério do CEJUM, ser remanejadas para outras Instituições interessadas.

Mais informações pelo telefone (61) 3313-9480 ou pelo e-mail Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..

Palestras

A programação do evento será divulgada em momento oportuno. O evento será transmitido ao vivo pela internet e as palestras poderão ser acessadas pelo canal do STM no Youtube.

 

 

A palestra que encerrou a tarde do II Curso de Direito e Processo Administrativo foi sobre o processo de tomada de contas dos agentes públicos, com o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas.

O artigo 37 da Constituição Federal foi citado como a “bíblia” do agente público, consolidando princípios como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Segundo o ministro, o princípio da eficiência não constava no texto original da Constituição e foi acrescido pela Emenda Constitucional nº 19 de 1998.

De acordo com Dantas, é possível violar a Constituição praticando um ato legal, impessoal, que obedeça à moralidade e à publicidade, caso o ato careça de mérito ou não atinja a destinação prevista.

“A governança pública pode ser traduzida de forma superficial como uma série de técnicas que permitem fiscalizar, medir, a eficiência de políticas públicas”, afirmou.

Para o ministro, o que o Tribunal de Contas vem fazendo nos últimos anos é, além de operar uma análise do aspecto legal, verificar se as políticas públicas têm obtido êxito ou estejam cumprindo a sua finalidade.

Tomada de Contas

Ao falar sobre o processo de tomada de contas, Dantas destacou três princípios constitucionais que são responsáveis pelo equilíbrio na análise das contas: devido processo legal; contraditório e ampla defesa; proibição da prova ilícita.

O palestrante também fez uma distinção entre três processos, a partir de suas características fundamentais: a improbidade administrativa pode ocorrer por uma mera violação a princípios da administração pública, como negar publicidade a um ato oficial; o processo administrativo disciplinar está relacionado ao descumprimento dos deveres inerentes ao serviço público e previstos na Constituição e nas leis; e a característica essencial da tomada de contas especial é a ocorrência de dano.

A tomada de contas, segundo o palestrante, pode ser iniciada por um prejuízo mesmo que ele seja presumido. O ministro explicou que, se há um recurso federal envolvido sem a prestação de contas correspondente, isso sinaliza algum tipo de desvio no processo.

“A lei inverte o ônus da prova: a ausência da prestação de contas faz o TCU presumir que houve um dano”, concluiu.

As palestras do II Curso de Direito e Processo Administrativo podem ser revistas na íntegra no canal oficial do STM no Youtube.

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