JULIANNA REGINA RODRIGUES NAVES LUCAS

Segunda, 09 Março 2015 00:00

STM abre a exposição Vozes da Defesa

O Superior Tribunal Militar (STM), em parceria com o Instituto dos Advogados Brasileiros e a Ordem dos Advogados do Brasil, inaugurou hoje a exposição “Vozes da Defesa”, que ficará aberta ao público até o dia 31 de março na sede do STM, em Brasília.

O Projeto Vozes da Defesa foi desenvolvido para destacar a atuação de grandes advogados brasileiros que, durante o regime militar, defenderam militares e civis na tribuna do Superior Tribunal Militar. “As Vozes da Defesa retratam um painel monumental da nossa nacionalidade e a sua característica maior, o resguardo dos Direitos Humanos no Brasil. Retratam, também, a opressão e o medo. As fraquezas humanas e a certeza de que o processo-crime eterno será sempre o da consciência contra o terror e a violência”, discursou a idealizadora do projeto, a presidente do Superior Tribunal Militar, ministra Maria Elizabeth Rocha, durante o lançamento.

Também na abertura da exposição, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, exaltou a iniciativa: "É com muita honra e felicidade que hoje venho representar os mais de 850 mil advogados do Brasil que homenageiam e saúdam o exemplo de seus colegas que atuaram de forma combativa pela manutenção do Estado Democrático de Direito, do devido processo legal e do respeito à dignidade do ser humano".

O Instituto dos Advogados Brasileiros foi representado por Aurélio Wander Bastos, que considera que o projeto Vozes da Defesa "é a recuperação da história brasileira em um dos seus momentos mais difíceis e revela o papel decisivo dos advogados na tribuna desse Tribunal defendendo os direitos humanos, a democracia e os direitos individuais".

O advogado Nélio Machado, uma das vozes apresentadas na exposição, também participou do lançamento. Segundo ele, a atuação solidária dos advogados no período do regime militar foi determinante para a superação de momentos conturbados. "Essa página foi vencida exatamente em função da postura dos advogados que não se intimidaram e também deste tribunal, do Superior Tribunal Militar, que embora tenha sido um tribunal de 'vencedores julgando vencidos', como dizia o saudoso Evaristo Moraes, nem por isso deixaram de ter a lei como um escudo, um parâmetro para evitar inequidades e injustiças”. 

Aberta ao público - A exposição é organizada pela Diretoria de Documentação e Divulgação do STM. O visitante terá acesso a uma sala ambientada com elementos do Plenário do STM em sua antiga sede, no Rio de Janeiro, onde poderá ouvir dez áudios históricos que registram as sustentações orais dos seguintes defensores: Sobral Pinto, Lino Machado Filho, Heleno Fragoso, Augusto Sussekind de Moraes Rego, José Luiz Clerot, Elizabeth Martins Souto, Nélio Machado, Luiz Eduardo Greenhalgh, Arnaldo Malheiros Filho e Técio Lins e Silva.

Todas as sustentações dizem respeito a processos que compreendem o período de 1976 a 1980 e que foram julgados com base na Lei de Segurança Nacional (DL 898/1969). Dentre os crimes estão a participação em organização subversiva; a ofensa à honra ou à dignidade do presidente ou vice-Presidente da República; a formação ou filiação à associação que exerça atividades prejudiciais ou perigosas à segurança nacional; e a reorganização de partido político ou associação dissolvidos por força de disposição legal.

Para a presidente do STM, os áudios demonstram que a parceria firmada entre os advogados brasileiros e os magistrados do Superior Tribunal Militar resultou na jurisprudência “dignificante do Superior Tribunal Castrense, muitas vezes edificada sob um destemido e irretocável contorcionismo jurídico em favor do cidadão, a exemplo da Representação nº 985, que rompeu a incomunicabilidade dos brasileiros encarcerados, proibidos de manter contato com seus defensores sob a égide da Lei de Segurança Nacional; do Recurso Criminal nº 5385-6 que assegurou o direito de greve declarado ilegal pelo Poder Executivo; e da Apelação nº 38.682 que garantiu a liberdade de expressão, mesmo expressa em linguagem censurável”.

A exposição “Vozes da Defesa” está aberta ao público do dia 10 a 31 de março, no museu do Superior Tribunal Militar, em Brasília. O horário de visitas é das 12h às 19h, de segunda à sexta. Depois do STM a exposição dever ir para as seccionais da OAB e para outros tribunais do país. 

 

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Ouça um trecho da defesa do advogado Heleno Fragoso, em processo criminal  julgado no STM em 1976 

 

O Plenário do Superior Tribunal Militar confirmou a soltura de um soldado do 19° Batalhão de Infantaria Motorizado, localizado na cidade de São Leopoldo (RS), que estava preso preventivamente desde o dia 28 de janeiro.

De acordo com o Auto de Prisão em Flagrante (APF), o soldado estava de serviço de guarda quando foi repreendido pelo cabo da guarda. Segundo uma das testemunhas, o soldado reagiu retirando “o carregador desmuniciado da arma, colocou um outro carregador municiado, executou o carregamento do fuzil, destravou o armamento e tentou apontá-lo para o cabo”.

A Defensoria Pública da União (DPU) pediu o relaxamento da prisão cautelar dois dias após o flagrante, o que foi negado pela primeira instância da Justiça Militar da União em Porto Alegre (RS), que alegou a necessidade da prisão preventiva para manutenção da hierarquia e disciplina da tropa do 19° Batalhão de Infantaria Motorizado.

A DPU entrou com o pedido de habeas corpus no Superior Tribunal Militar com o argumento de que o militar se encontrava preso há 15 dias, o que já teria servido para manter os pilares da disciplina no âmbito militar, “não havendo motivos para a prisão durante toda a instrução processual”.

Segundo a defesa, a manutenção da prisão do militar violaria “os princípios da dignidade humana, a garantia do devido processo legal e a presunção de inocência, sendo certo que a restrição da liberdade é medida de caráter excepcionalíssimo, não justificada no caso presente”.

O relator do habeas corpus, ministro José Barroso Filho, já havia concedido liminar para soltar o soldado, caso ele não estivesse preso por outro motivo. E nesta quarta-feira (4), o Plenário confirmou a decisão do relator por unanimidade.

“A gravidade do ato justificou a prisão em flagrante, mas passados mais de vinte dias, não há motivo para a manutenção dessa prisão. Não se trata aqui de antecipação de condenação, mas sim, se há requisitos ou não da cautelar. Não há nenhum perigo, nenhuma informação que a justifique, daí a razão da concessão da liminar”, votou o ministro Barroso. 

Quinta, 05 Março 2015 00:00

Saiba como você pode ajudar.

O Superior Tribunal Militar, atendendo ao pedido do Tribunal de Justiça do Acre (TJ-AC), divulga campanha para ajudar as vítimas da enchente do Rio Acre. De acordo com as informações enviadas pela presidente do TJ-AC , a desembargadora Cezarinete Angelim, mais de 4 mil famílias estão desabrigadas.

“Nesse cenário, evidenciam-se alta probabilidade de incidência e contágio de enfermidades diversas, serviços públicos essenciais paralisados, economia e comércio locais abalados, avenidas e pontes próximas à ocorrência das enchentes interditadas, trânsito em estado caótico e demais infortúnios sociais, como o crescimento de crimes contra o patrimônio e dignidade sexual, fatos sociais que enfraquecem a dignidade da pessoa humana desses brasileiros”, destacou a desembargadora.

O movimento Acre Solidário, coordenado pela primeira-dama do Estado do Acre, concentra o recebimento de doações em dinheiro para ajudar as vítimas. A conta bancária utilizada foi cedida pela Diocese de Rio Branco. Depósitos de qualquer quantia podem ser enviados para a conta corrente 500-2, agência 0071-X, Banco do Brasil.

Os pontos que recebem donativos são a OCA, Palácio das Secretarias, Quartel da Polícia Militar, Igreja Batista do Bosque e Universal, além das lojas da rede de Supermercados Araújo e Dayane, todos na cidade de Rio Branco. As coordenações do Acre Solidário e da Rio Branco Amiga ressaltam que os principais itens necessitados neste momento são: leite, massa para mingau e fraldas descartáveis.

A desembargadora ressaltou, no entanto, que qualquer tipo de ajuda na doação de alimentos, roupas, utensílios domésticos básicos (colchões, lençóis, etc.) e, principalmente, no trabalho voluntário nas áreas de abrigos das vítimas das enchentes, representará uma inestimável ajuda ao Estado. 

 

O Plenário do Superior Tribunal Militar julgou na tarde desta terça-feira (3) um recurso impetrado pela defesa de ex-soldado da Aeronáutica que atirou acidentalmente em outro militar, provocando a morte da vítima. O réu havia sido condenado pela Auditoria de Belém a um ano, cinco meses e nove dias de detenção por homicídio culposo. A Defensoria Pública da União (DPU) apelou ao Superior Tribunal Militar destacando não haver no caso concreto a previsibilidade para a caracterização do crime culposo.

Conforme consta na denúncia oferecida pelo Ministério Público Militar (MPM), o acidente aconteceu quando o réu “utilizou a arma que utilizava em serviço com fim de brincar com seus companheiros de farda; manuseando a arma que já estava com carregador, sem verificar se ela estava municiada; por fim, acionou o gatilho de uma arma com carregador, sendo que o cano estava direcionado para onde estavam os dois companheiros de farda, tendo o projétil atingido a vítima, causando-lhe a morte”.

Durante o julgamento no STM, a defesa argumentou que o réu não poderia prever o resultado de sua conduta, pois quando foi passado o serviço na Base Aérea de Belém ao apelante, a arma já lhe fora entregue municiada, o que contraria a Norma Padrão de Ação para o serviço de Armeiro-de-Dia. Essa norma determina que, durante a passagem do serviço, a pistola deve ser entregue aberta, sem carregador, para que o militar que a recebe possa efetuar as medidas de segurança. A DPU destacou que o elemento da previsibilidade, indispensável ao crime de homicídio na sua modalidade culposa, não foi provado no caso, pois o réu não sabia que a arma estava carregada.

Segundo o relator do caso no STM, ministro Lúcio Mário de Barros Góes, o réu, “alegando ter chegado atrasado para o expediente, e por ter outras tarefas a cumprir, deixou de receber o armamento de serviço com os procedimentos de segurança exigidos pela Norma, sendo caraterizada, portanto, a inobservância do dever de cuidado que lhe incumbia, de acordo como as circunstâncias e suas condições pessoais. Além da negligência, também a imprudência ficou caracterizada, uma vez que o próprio réu admitiu que a arma disparou enquanto ele fazia uma brincadeira com o armamento”.

O relator ainda ressaltou que os depoimentos de testemunhas e documentos constantes dos autos demonstram que o réu recebeu treinamento específico para o serviço de Armeiro, inclusive orientações específicas de que não deveria brincar com a arma, além de possuir considerável experiência. “Apesar disso, deixou de adotar os procedimentos de segurança, além de brincar com a arma de fogo, apontando-a para a vítima. Não há razão, portanto, para considerar que o agente não tinha a possibilidade de prever o resultado danoso”.

O Plenário do STM acompanhou o voto do relator por unanimidade de votos.

O Plenário do Superior Tribunal Militar julgou na tarde desta terça-feira (3) um recurso impetrado pela defesa de ex-soldado da Aeronáutica que atirou acidentalmente em outro militar, provocando a morte da vítima. O réu havia sido condenado pela Auditoria de Belém a um ano, cinco meses e nove dias de detenção por homicídio culposo. A Defensoria Pública da União (DPU) apelou ao Superior Tribunal Militar destacando não haver no caso concreto a previsibilidade para a caracterização do crime culposo.

Conforme consta na denúncia oferecida pelo Ministério Público Militar (MPM), o acidente aconteceu quando o réu “utilizou a arma que utilizava em serviço com fim de brincar com seus companheiros de farda; manuseando a arma que já estava com carregador, sem verificar se ela estava municiada; por fim, acionou o gatilho de uma arma com carregador, sendo que o cano estava direcionado para onde estavam os dois companheiros de farda, tendo o projétil atingido a vítima, causando-lhe a morte”.

Durante o julgamento no STM, a defesa argumentou que o réu não poderia prever o resultado de sua conduta, pois quando foi passado o serviço na Base Aérea de Belém ao apelante, a arma já lhe fora entregue municiada, o que contraria a Norma Padrão de Ação para o serviço de Armeiro-de-Dia. Essa norma determina que, durante a passagem do serviço, a pistola deve ser entregue aberta, sem carregador, para que o militar que a recebe possa efetuar as medidas de segurança. A DPU destacou que o elemento da previsibilidade, indispensável ao crime de homicídio na sua modalidade culposa, não foi provado no caso, pois o réu não sabia que a arma estava carregada.

Segundo o relator do caso no STM, ministro Lúcio Mário de Barros Góes, o réu, “alegando ter chegado atrasado para o expediente, e por ter outras tarefas a cumprir, deixou de receber o armamento de serviço com os procedimentos de segurança exigidos pela Norma, sendo caraterizada, portanto, a inobservância do dever de cuidado que lhe incumbia, de acordo como as circunstâncias e suas condições pessoais. Além da negligência, também a imprudência ficou caracterizada, uma vez que o próprio réu admitiu que a arma disparou enquanto ele fazia uma brincadeira com o armamento”.

O relator ainda ressaltou que os depoimentos de testemunhas e documentos constantes dos autos demonstram que o réu recebeu treinamento específico para o serviço de Armeiro, inclusive orientações específicas de que não deveria brincar com a arma, além de possuir considerável experiência. “Apesar disso, deixou de adotar os procedimentos de segurança, além de brincar com a arma de fogo, apontando-a para a vítima. Não há razão, portanto, para considerar que o agente não tinha a possibilidade de prever o resultado danoso”.

O Plenário do STM acompanhou o voto do relator por unanimidade de votos.

O vice-presidente do Superior Tribunal Militar, ministro Fernando Sérgio Galvão, publicou artigo na edição de fevereiro da Revista Justiça e Cidadania. No texto, ele trata da questão do julgamento de oficial da reserva não remunerada por Conselho de Justiça, na primeira instância da Justiça Militar da União: o processo e julgamento devem ser conduzidos por Conselho Permanente ou Conselho Especial?

O artigo pode ser acessado aqui.

 

 

 

O Superior Tribunal Militar (STM) condenou dois oficiais do Exército por desvio de dinheiro público, entre os anos de 2001 e 2006, originalmente destinado a suprir despesas da 1ª Divisão de Levantamento em Porto Alegre (RS). Um coronel reformado e um tenente-coronel da ativa foram condenados a três anos e seis anos de reclusão, respectivamente, pelo crime de peculato, previsto no artigo 303 do Código Penal Militar. O total desviado foi de quase R$ 500 mil reais, em valores não atualizados. 

Segundo a denúncia do Ministério Público Militar (MPM), em 10 de outubro de 2001, foi firmado um Protocolo de Intenções entre o Comando do Exército e a Fundação de Apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (FAURGS), tendo como propósito o intercâmbio de serviços nas áreas de cartografia, fotogrametria, topografia e informática, além de outras áreas. 

As transferências de recursos entre as duas instituições deveriam ser precedidas pela celebração de convênios específicos. No entanto, a 1ª Divisão de Levantamento passou a executar, em favor da Fundação, despesas com inexigibilidade de licitação. Na denúncia, o Ministério Público afirma que “o repasse dos valores públicos à FAURGS serviu apenas para a montagem de um verdadeiro ‘caixa 2’, com o dinheiro retornando, em espécie, para uso dos militares da 1ª Divisão de Levantamento e para que fosse utilizado sem qualquer tipo de controle dos órgãos internos e externos da Administração Pública”.  

O total de valores repassado à Fundação chegou a R$ 494.099,40, em valores não atualizados. Os dois oficiais acusados chefiaram e exerceram o cargo de Ordenador de Despesas da 1ª Divisão de Levantamento durante o período em que utilizaram parte da verba pública para custear aulas de voo particulares, o abastecimento e a lavagem de veículos próprios e outros gastos com nítido caráter particular, como churrascarias, compras de supermercado e farmácia. 

Os militares foram absolvidos na primeira instância da Justiça Militar da União em Porto Alegre (RS) e o Ministério Público entrou com recurso no Superior Tribunal Militar (STM) para a condenação dos réus. A defesa dos réus argumentou que os recursos desviados foram aplicados em atividades da própria organização militar com o objetivo de melhorá-la com menos burocracia e que haveria respaldo legal para tanto. Desta forma, a defesa sustentou que os militares não agiram com o dolo próprio do tipo penal do peculato. 

Para o relator do caso no STM, ministro Luis Carlos Gomes Mattos, em observância ao “princípio da legalidade, previsto no artigo 37 da Constituição da República, não pode o Administrador fazer senão aquilo que a lei expressamente autoriza, sendo que, diante de seu silêncio, sequer pode agir mesmo que em face do mais elevado interesse público”. 

O Tribunal, por unanimidade, acompanhou o voto do relator para condenar o coronel reformado a três anos de reclusão e o tenente coronel, incurso por sete vezes no crime de peculato, a seis anos de reclusão. 

Ouça matéria na Voz do Brasil

 

Para encerrar o Encontro da Justiça Militar da União com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), o ministro do Supremo Tribunal Federal Francisco Rezek traçou um panorama sobre a atuação da CIDH no contexto de importantes casos dos últimos anos, como a ordem de paralisação da obra da Usina de Belo Monte e da sentença do caso Mendes Lopes, que resultou na primeira condenação do Brasil pela Corte Interamericana.

Casos envolvendo a decisão do governo da Bolívia em declarar nacionais as refinarias da Petrobrás e a decisão da justiça brasileira de não atender ao pedido da Itália pela extradição de Cesare Battisti foram apontados como situações hipotéticas em que os Estados soberanos envolvidos poderiam acionar a Corte de Haia para decidir os processos. O ministro utilizou esses exemplos para ilustrar a especificidade da Corte de Haia que exerce jurisdição unicamente nos conflitos entre estados soberanos.

Em relação à Corte Interamericana de Direitos Humanos, Francisco Rezek destacou “a grande utilidade em dispor de um mecanismo de uma organização regional de controle dos direitos humanos quando se leva em conta certas situações em que as sociedades nacionais, e a própria comunidade jurídica, se acostumam com algo que é patológico, e não se dão conta dessa patologia a menos que um órgão internacional lhes dê um recado corretivo”.

No entanto, o ministro reflete a aparente “concorrência entre uma corte regional de direitos humanos e os tribunais e autoridades internas de direitos humanos”. Na visão de Rezek, isso acontece principalmente pelo cenário de sociedade internacional descentralizada da atualidade em que 193 estados soberanos não constituíram até hoje uma espécie de autoridade supranacional. “Os mecanismos internacionais são todos de coordenação e não de subordinação. Ainda por muitos anos isso irá perdurar, a constituição de cada estado soberano é a âncora que uma sociedade nacional pode contar para buscar a sua segurança jurídica”, avaliou o palestrante.

No sentido de aperfeiçoar a atuação da Comissão e da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Francisco Rezek apontou pontos que merecem reflexão. A começar pela questão do tempo, o ministro declarou ser conveniente que a CIDH se concentre mais no presente e no futuro do que no passado. Segundo Rezek, o convênio assinado entre o Conselho Nacional de Justiça e o Sistema Interamericano nesta semana serve “para arejar as cabeças da justiça criminal à luz dos princípios modernos de processo penal e de preservação dos direitos humanos. Projeta a competência dessas instituições para o futuro. O sistema de proteção dos direitos humanos não se deve converter em uma inquisição dos direitos humanos violados no passado”.

Para Francisco Rezek, o sistema interamericano deve empreender esforços para não interferir nas opções políticas das várias nações soberanas que se submeteram ao Pacto San José de Costa Rica. Um dos exemplos que embasam o ponto de vista do ministro foi a determinação da CIDH para paralisar a construção da Usina Belo Monte. “A questão havia sido decidida por um governo, legislada pelo Congresso e submetida ao STF que declarou sua constitucionalidade. Obras desse porte obviamente têm efeitos colaterais. A prerrogativa de qualquer governo é sopesar a relação custo/benefício”.

O palestrante ainda enfatizou que lidar com direitos humanos não deve ser encarado pelos organismos internacionais e domésticos como uma tarefa simplista. A universalidade desses direitos representa um desafio constante. Exemplos como a proibição pelo estado da França ao uso do véu islâmico ilustram o problema. “Em que medida a ideia da universalidade dos direitos humanos nos permite interferir em ações que poderiam ser toleradas?”

Rezek destacou que o Supremo Tribunal Federal vai se deparar cada vez mais com essa ambiguidade dos direitos humanos, como nas situações em que terá que decidir sobre pesquisas com células-tronco embrionárias e a legalização do aborto. “Nesses casos, o Supremo irá prestigiar esse direito humano ou aquele e amargará o sacrifício daquele que não prevaleceu”, finalizou o ministro. 

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Na manhã desta quinta-feira (12), os palestrantes que encerraram o Encontro da Justiça Militar da União com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos destacaram que a troca de experiências internacionais e dos seus respectivos modelos de jurisdição militar é o grande legado e responsabilidade dos Estados soberanos na observância dos parâmetros internacionais de direitos humanos.

O contra-almirante e diretor do Centro de Estudos Superiores em Justiça Militar, Julio Enrique Pacheco Gaige, durante a palestra “A jurisdição militar no Peru e o cumprimento dos padrões internacionais da administração da justiça” afirmou que, nos últimos anos, o Peru vem empreendendo esforços constantes para sujeitar as normas internas de sua jurisdição militar aos padrões internacionais. O especialista expôs as consequências do conflito armado que perdurou no Peru entre os anos de 1980 e 2000 - e que tiveram como principais executores o grupo Sendero Luminoso, o Movimento Revolucionário Tupac Amaru e o governo do Peru -, na estrutura, competência e futuro da Justiça Militar naquele país. Pacheco explicou como a legislação foi alterada para que a Justiça Militar ficasse encarregada do julgamento dos envolvidos nas mais de 62 mil mortes que a luta deixou.

Em 2000, uma comissão foi criada pelo Estado peruano para revisar as decisões da Justiça Militar, que chegou à conclusão de que 98% das sentenças respeitaram o devido processo legal. O especialista destacou que, no entanto, grupos e organizações não-governamentais deram início a uma série de ataques à Justiça Militar e não ao governo e ao Poder Legislativo, que delegaram à instituição a incumbência de processar e julgar crimes de terrorismo.

O que se seguiu nos anos seguintes, conforme Pacheco, foram oito sentenças do Tribunal Constitucional do Peru contra a Justiça Militar, com as determinações de que ela não poderia mais julgar crimes de terrorismo nem de traição à pátria, que os crimes de sua competência teriam que ter uma conexão clara com a função militar e que os magistrados dessa Justiça não poderiam ser militares ou ter qualquer vínculo com as Forças Armadas.

Em 2009, o Tribunal Constitucional do Peru, fazendo uso da técnica de overruling, na qual um precedente perde sua força vinculante e é substituído por outro entendimento, emitiu uma sentença que estabeleceu os parâmetros atuais da jurisdição militar. Foi também nesse ano que o Tribunal começou a compatibilizar as normas internas com a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

“Finalmente, o Tribunal Constitucional entendeu que a Justiça Militar tem uma missão a cumprir e essa missão pode ser cumprida mantendo-se os padrões internacionais e internos de respeito aos direitos humanos”, afirmou Pacheco. Atualmente, os juízes da Justiça Militar peruana são oficiais generais já reformados, e por isso considerados civis, sem ligação direta ao comando das Forças. A competência se centra no julgamento dos delitos de função, que abarca toda conduta ilícita cometida por militar da ativa no exercício de suas funções e que ferem os bens jurídicos próprios da ordem militar.

Caso Argentino

Na palestra seguinte, o professor da Universidade de Buenos Aires Diego Dolabjian expôs o caso da Justiça Militar na Argentina. Segundo ele, o sistema de Justiça Militar deixou de existir como modelo independente. A matéria de direito militar e os julgamentos foram incorporados pelo Código Penal comum e são da competência de juízes federais comuns. Dolabjian apontou que essa situação decorreu da articulação entre o cenário nacional e o internacional.

O especialista identificou que essa articulação foi tecida, principalmente, como efeito da última ditadura militar argentina, quando uma das primeiras normas editadas no período foi a de ampliar a competência da Justiça Militar para julgar os civis em crimes de subversão. Em 1979, diversas denúncias referentes aos atos praticados durante a ditadura motivaram a Corte Interamericana de Direitos Humanos a visitar a Argentina e um relatório subsequente apontou várias violações graves aos direitos humanos, cometidas por ação ou omissão no período de 1975 a 1979.

De acordo com Dolabjian, uma das primeiras medidas de Raúl Ricardo Alfonsín, o presidente democraticamente eleito em 1984, após a ditadura, foi a ordem de se processar e julgar os militares envolvidos nas agressões aos direitos humanos. A lei editada para esse fim estabeleceu um procedimento próprio para julgar as juntas militares, que deveria ser conduzido pela Justiça Militar. A lei ainda definiu que caso fosse observada uma demora injustificada para a conclusão dos julgamentos, a Justiça comum deveria assumir a competência.

O Conselho Supremo das Forças Armadas, órgão responsável pelo julgamento, concluiu que as ordens ditadas durante o período eram legítimas e que os envolvidos não poderiam ser responsabilizados penalmente por elas. A Câmara Federal assumiu os processos e condenou as juntas em 1985. De acordo com Dolabjian, o fato de a Corte Interamericana ter apontado em 1979 as várias violações aos direitos humanos e a Justiça Militar ter julgado em sentido contrário intensificou o debate quanto à objetividade e a neutralidade dessa justiça especializada. O resultado foi que, em 1985, a Corte Suprema argentina declarou a inconstitucionalidade da Justiça Militar.

Nesse mesmo ano, a Corte argentina determinou também que os direitos constitucionais e o sistema jurídico deveriam ser interpretados de acordo com os organismos internacionais, o que na visão do especialista representou a vanguarda do controle de convencionalidade.

Desafios comuns

A manhã de hoje também contou com a palestra de Miguel Revenga Sánchez, que destacou a importância dos debates realizados durante o Encontro. “O mais surpreendente é que nós partilhamos desafios comuns. Um dos grandes tópicos do constitucionalismo atual é o diálogo, a abertura e a interconexão. Esses três princípios só são levados a efeitos quando se compartilham valores e ideias e quando se avança em termos de técnicas para se assegurar a liberdade dos Estados e dos direitos fundamentais inerentes”.

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Na tarde do terceiro dia (11/02) do Encontro da Justiça Militar da União com a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, quatro palestrantes estrangeiros debateram sobre o Estado Constitucional na América do Sul, a sentença da Corte Interamericana no caso La Cantuta no Peru, o direito militar alemão e o futuro da jurisdição militar em todo o mundo.

O juiz da Corte Suprema de Justiça da Argentina, Raúl Gustavo Ferreyra, falou sobre o estado constitucional na América do Sul por meio de paralelos com os artigos da Constituição Federal do Brasil. A advogada e assessora da Comissão de Relações Exteriores do Congresso da República do Peru, Gissell Rubin Morales, apresentou um estudo do caso La Cantuta e da sentença que determinou, em 2006, a responsabilidade do estado peruano pelo desaparecimento forçado e a execução de um professor universitário e de nove estudantes da universidade La Cantuta por membros das Forças Armadas que consideraram as vítimas como opositores ao governo da época.

A palestrante apontou que as duas Leis da Anistia editadas no país impediram a condução de investigações e a responsabilização penal dos militares envolvidos no caso. A sentença da Corte Interamericana assinalou que tais leis são incompatíveis com a Convenção Americana dos Direitos Humanos e, por isso, carecem de efeito jurídico.

Em seguida, o professor de Direito Militar da Universidade de Speyer na Alemanha, Alexander Poretschkin, falou sobre os direitos humanos na Europa em relação à Justiça Militar. O especialista deu destaque à relação entre questões militares disciplinares e os direitos humanos. Poretschkin ilustrou a relação com o exemplo de um subordinado que é obrigado a obedecer imediatamente às ordens de seu superior, sem questioná-las, ainda que a ordem possa ser ilegal. O palestrante debateu se haveria nesse dilema entre o compromisso militar e a responsabilidade de agir conforme a lei uma ofensa aos direitos humanos.

Na última palestra do dia, o promotor da corte de apelação de Atenas, na Grécia, Dimitrios Zafeiropoulos, falou sobre as tendências atuais da jurisdição militar internacional. Segundo ele, as legislações especiais ao redor do mundo são muito diversas em termos de jurisdição militar em razão dos diversos parâmetros políticos, culturais, históricos, e dos interesses em segurança e a situação legislativa de cada país.

No entanto, para o promotor, apesar de haver países em que a Justiça Militar foi abolida e outros em que a estrutura foi modificada, é possível definir um denominador comum: as Forças Armadas mantêm um papel de destaque nas diversas sociedades, o que faz com que os países implementem medidas especiais para garantir que os militares tenham garantido o acesso à Justiça. “Nas nações que aboliram a Justiça Militar, foram estabelecidos mecanismos específicos para garantir que o sistema judicial civil funcione adequadamente para os militares. Um deles é manter os promotores civis em constante contato com o ambiente militar”, finalizou Zafeiropoulos. 

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